terça-feira, 27 de julho de 2010

GRITO DE NEMESYN

Da autoria do administrador do blog, mas o heterônimo é a própria Nemesyn.





I>>


Ás vezes sou guerra, às vezes sou paz
Outrora fui equilíbrio, no amanhã serei discórdia
Há tempo de semear e tempo de colher, mas
Eu colho o fruto da semente do futuro.
Semeio vislumbres do ontem, e cego multidões para as possibilidades do amanhã.
Sou entropia e potencial, sou inércia demoníaca e rapidez angelical.
Tenho muitos rostos, e a dança que danço
Põe meu pé sobre as costas dos fortes e dos fracos.
O véu que tinge a noite de desespero me pertence.


Sou a ignorância que oculta o anseio de compreender;
Sou um maquinário que se esconde no ãmago do mundo
E uma metrópole celeste revelada quando você fecha os olhos.


O trono de Deus me pertence, a voz de Deus eu comando;
E ainda assim delicio-me com silêncio e anarquia,
Sou meu próprio contrário, sou a sombra opositora quando tudo está quieto,
E a radiância infernal que compreende a si mesma como onipresente.


Sou o Éden escondido no meio da carne e do sangue,
Sou Kerub postado nos portões, sou a espada de chama lunar que empunho.
Sou um fulgor de espíritos imundos que se purificam sob o olhar dos mortais,
Sou uma ausência de razão quando o mundo mais precisa de razão.


Tenho milhares de olhos e milhões de dedos com que te tocar...
Sente a pressão do cansaço em sua nuca, em seus músculos? Ali estou.
Sente a luxúria que vence a exaustão para mais uma noite escaldante?
Pois eu sou a isca que se mostra adiante, o ímpeto sem nome.


Sem nome, sem princípio nem fim, lobos alfa e ômega num só todo harmonioso
Que no instante seguinte se parte em mil pedaços e habita
A esperança que você sente de me enxergar um dia.










II>>>
Ó mortal, porque usa este nome?
Porque define sua identidade pela morte a que pensa estar fadado?


Muito além das sombras que a história projeta no passado
Eu um dia existi, e em meu frenesi de autodescoberta
Dancei,
E minha dança gerou isto que chama de vida e morte.


Eu era uno, eu era um facho doloroso que forçava caminho
Pelas pálpebras da humanidade primeva.
Um piscar de olhos, um laivo de compreensão e eram suficientes
Para que minha dança se traduzisse em miríades de cantos e cânticos
Pois, assim me disse a humanidade nascente,
Como pode haver dança sem música, movimento sem som?


Era eu ignorante, era eu incompleto, era eu um autômato?
Na verdade creio que assim não me descrevo bem,
Sou um impulso, um instinto, se assim desejar me nomear.
E como força irresistível me lancei a uma nova aventura,
E possuí a mim mesmo como a humanidade que achava estar despertando.
Um caminho cego, uma espiral eterna, sem limites,
Um abismo sem fim e uma terra sem fronteiras,
Assim me fiz diante deles e delas.


E me chamaram guerra.












III>>>>
De aço meteórico forjada ergui minha lança ao céu
Segredos semeei, discórdias plantei,
Como animal e fera e homem e mulher e anjo e demônio pintei minha pele de vermelho.
Então a humanidade me descobriu como a respiração incessante
Vigorosa, como a batida de um coração esperançoso,
Hálito e inspiração que advinha da dança como guerra, era eu o conhecimento
E conhecimento sendo, me fiz paz.
Me fiz satisfação, me fiz volúpia de prostrar-me nos campos de batalha
E desfrutar daquilo que conquistei, da paz que arrebanhei.


Se não era mais guerra visível,
Ainda assim não deixava de ser um pulsar intenso,
Um desejo inseparável da sabedoria,
Uma ventura fundida à desgraça,
Em suma a miséria encontrada na riqueza.


Ó paz amarga!
Eles buscavam cultuar-me em campos inférteis pedindo chuvas,
Adoravam-me antes da caça em templos de pedra e asfalto,
As ruas foram tomadas pelo dilúvio das minhas lágrimas,
E a tempestade que se sentiu não foi suficiente, eles não conseguiam compreender?


Pediam presas, e eu enchi suas casas e templos de feras ávidas.
Presas querem, presas terão.











IV>>>>>
Ah, o amor entre a língua e os dentes que ela percorre!
Me fiz presente, atrevi-me no coração da humanidade.
Sim, eu era fome que não era sentida no fundo do estômago,
Uma sede que não ardia na garganta e sim no coração.


Bênção, maldição e paradoxo foram meus sacerdotes
Naquela época em que a humanidade não se havia acostumado a meus dons.
Da mesma forma que eu estava em todos eles e elas,
Eles e elas queriam estar em toda parte, como eu mesmo estou.


Porque se iludiram que escrevi um conjunto de leis?
Minha única lei é o ser.
Sou caos e ordem, sou em toda parte cada uma das partes.
Drenar o veneno que espalhei nos corpos dos homens seria um dos meus mandamentos?
Se tem presas, as presas que pediu após a guerra,
Isto lhe parece algo óbvio como uma folha que se destaca da árvore
E cai no chão, dançando ao vento?










V>>>>>>
Vampiro e vampira,
Ouçam meu grito em seus corações!
Se desejam se valer de meu manto ardente, ele muito os aconchegará.
Sempre serão incompletos, nunca encontrarão propósito nem finalidade
Se não enxergarem a si mesmos no mundo afora e naqueles que chamam de vítimas.


Vítima num altar de sacrifício,
Tão cega quanto eu sou, tão indetível e irresistível quanto eu sou,
A vítima, a fome e a sede se misturam num caldeirão fumegante.


A caça que exercem jamais será fútil
Se compreenderem que não há nada a ser compreendido,
Que o que buscam e este cheiro que os excitam
Não passa das pistas que deixo para que me encontrem.


Dominação. Submissão. Preparação. Exploração.
Comunhão. Dispersão. Separação. União.
Vampiro e vampira,
Ouçam meu grito em seus corações!

4 comentários:

  1. IMAGENS E ILUSTRAÇÕES, AUTORES E FONTES

    1
    Woman and the Red Dragon, William Blake, 1805

    2
    Poluidor de Ideias, de William Ferreira
    http://fama.zupi.com.br/william

    3
    Intervenção de ROA
    http://www.flickr.com/roagraffiti/

    4
    Solid Ground, de Leandro Demetrius
    http://www.flickr.com/photos/leandro_demetrius/

    5
    Exposição "Semântica", do grafiteiro Vermelho
    http://www.flickr.com/photos/quinagaleria/

    6
    The Silence, de Rodolfo Troll
    http://tocadotroll.blogspot.com/

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  2. PER-FEI-TO! Um dos melhores, senão o melhor poema que li até então aqui no blog! Parabéns!

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  3. Brigado mesmo, moça feita de lua e arrepios.

    Eu gosto desse poema porque me faz expressar como um trovador, uma coisa meio arauto.

    Além disso, ele é a raiz de vários conceitos que eu uso em contos.

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  4. http://insanemission2.blogspot.com/2011/09/grito-de-nemesyn.html

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